Confira a entrevista com um dos principais ganhadores do Festival Chocolat-Xingu, Antônio Senna. O produtor rural e chocolateiro de Igarapé-Miri, conquistou o primeiro lugar na categoria Intenso, principal categoria do evento, com o chocolate Yeshua, destacando a cidade como mais um polo da produção de cacau e chocolate do Pará. Senna também conquistou o segundo lugar na categoria Chocolate ao Leite com o Ascurra, em parceria com a produtora Sarah Brogni de Medicilândia, que também foi aluna do SENAR e hoje é uma das instrutoras pela Escola Indústria de Chocolate SENAR. Com uma participação ícone no Chocolat Xingu 2024, Antônio garantiu ainda o terceiro lugar na categoria Produto Inovação, também com o Yeshua.
Pará Rural: Antônio, pode falar um pouquinho pra gente como é, como tudo começou na sua vida até chegar nesse ápice?
Entrevistado: Eu sou de Igarapé-Miri, na região do Baixo Tocantins, ali no Nordeste paraense. A nossa família já trabalhava há muito tempo com açaí na área de várzea, cacau antigo também. E, há muitos anos, a gente vinha só se dedicando à produção do açaí, já que a área comercial do açaí é bem extensa, então o nosso foco principal era o açaí. Com o passar dos anos, nós adquirimos uma propriedade, uma área de terra firme de um engenheiro aposentado da Embrapa. Ele resolveu vender essa propriedade, e nós vimos ali uma oportunidade de poder trabalhar ainda mais com o cacau. Inicialmente seria trabalhar apenas com o açaí de terra firme, aquela área que é mais rica pro açaí, tanto que lá é conhecido como capital mundial do açaí. Trabalhar com o cacau lá, onde já é reconhecido pelo açaí, foi um desafio. Poder implantar a questão do chocolate artesanal e chocolate fino na nossa cidade, no início, foi um pouco desafiador pra quem só gosta de tomar açaí.
Pará Rural: Quantos hectares hoje vocês trabalham voltados pro cacau?
Entrevistado: Voltados pro cacau, são cerca de 60, 70 hectares de plantio em SAF’s, em áreas de terra firme e áreas de várzeas também.
Pará Rural: Então na terra firme já tem irrigação?
Entrevistado: Isso, na verdade, quando nós adquirimos a propriedade, precisamos fazer algumas modificações pra que nós pudéssemos ter boa colheita e resultados bons na questão do cultivo, dos tratos culturais, do plantio que já estava estabelecido na propriedade.
Pará Rural: Como você conheceu o Senar?
Entrevistado: Conheci o Senar através do engenheiro agrônomo que estava acompanhando a gente no início, na propriedade de terra firme. Ele falou para gente trabalhar com o cacau, fazer o possível pra estar melhorando os nossos tratos culturais, para poder estar recebendo um incentivo maior do Senar na nossa propriedade. E, através dele, nós conseguimos acesso ao Senar, começando um trabalho já voltado para questão do cacau fino.
Pará Rural: Eu já sei que foram vários inclusive, que você participou. Pode falar quais foram quais treinamentos você teve a oportunidade de participar?
Entrevistado: A minha primeira oportunidade foi através do Curso Técnico em Agronegócio, no Polo de Moju. Na época, ainda não tinha o curso. Eu fui pra Moju, fiquei sabendo e consegui uma vaga através do processo seletivo. Foram dois anos de muito aprendizado, sobre como administrar uma empresa rural, também fiz um Curso em Agronegócio. Esse curso trouxe muitos benefícios para nossa propriedade e sobre como administrar cada setor. Foram aulas incríveis. Depois que terminei esse curso, a gente entrou no ATeG – Mais Cacau, também pelo Senar. Nós recebemos esse incentivo, que foi maravilhoso. Foram dois anos de implementação, de muita técnica, para que nós viéssemos estabelecer o plantio de cacau da melhor qualidade possível, melhorando nossos tratos culturais e o beneficiamento primário. Tudo isso, a ATeG contribuiu para o nosso sucesso hoje. Depois do ATeG, eu vim pra Marituba fazer um curso na CEPLAC de beneficiamento primário também, na cadeia produtiva do cacau. Foi um tempo maravilhoso, uma imersão incrível, com pessoas que sabem tudo de cacau. A gente até falava que lá é a Universidade do Cacau. Aprendemos muita coisa boa com pessoas incríveis ali.
Pará Rural: Falando em universidade, você é especialista agora também, né?
Entrevistado: Isso, exato. Através da CEPLAC, a gente conseguiu alcançar esse status de especialista em cacau. Isso é uma honra, muito boa também.
Pará Rural: E é o primeiro festival que você participa?
Entrevistado: Não, não. A primeira vez eu participei foi aqui em Belém. Eu fui apenas como produtor, apenas para conhecer o que é o Festival de Chocolate. Aquilo ali me encantou. Eu cheguei e quase falei: “Gente, a gente precisa continuar investindo em cacau. Ano que vem eu quero expor meu chocolate no festival.” No ano seguinte, eu comecei a me dedicar, fui para a Escola Indústria do Senar, participei da primeira oficina de chocolate, lá em Igarapé-Miri. Ali, nós produzimos cerca de 30 barras de chocolate. Muito pouco para um festival grandioso como é o Festival Chocolat. Mas, graças a Deus, foram um sucesso aquelas barras de chocolate intenso que nós fizemos. Nos anos seguintes, já participei consecutivamente em Belém, aumentando a produtividade, participando de oficinas na Escola Indústria do Senar. Depois eu tive a minha formação em chocolataria, em chocomaker, pelo Senar, um pouco mais extenso para que eu tivesse mais conhecimento de como realmente fazer um chocolate.
Pará Rural: A sua paixão é o cacau e agora o chocolate, né?
Entrevistado: Sim, com certeza.
Pará Rural: E o conhecimento não para?
Entrevistado: Com certeza, agrega muito.
Pará Rural: Eu acho que não à toa você ganhou de inovação. Por que a pessoa que busca conhecimento acaba inovando, né? Você fala um pouquinho, então, das premiadas deste ano do Festival de Cacau para a gente, do Festival de Chocolate?
Entrevistado: Sim, esse ano a gente foi lá para Altamira e nunca imaginaria que voltaria com três prêmios. Nunca imaginaria que voltaria com um prêmio. Graças a um amigo, Seu Lahire, um grande incentivador da minha marca de chocolate. Na oficina, ele esteve presente e olhou para mim, dizendo: “Por que não coloca o nome da tua marca de chocolate Cacau Yeshua? Cacau Yeshua Chocolate.” Olhei na cara dele, sério, e fiquei emocionado. Falei: “Tá beleza, então vamos lá.” Ali naquela oficina nasceu a marca Cacau Yeshua Chocolate, graças ao incentivo do meu amigo Lahire, que nos deu a mão, nos dá a mão para todos os chocolateiros de Baixo Tocantins. Desde então, tenho levado essa marca. Fui agora para Altamira. Ele falou: “Cara, participa lá com o teu chocolate branco com cumaru. Te inscreve no concurso. Tu vai ganhar o prêmio.” Muito otimista, mais do que eu.
Pará Rural: Pro nome, né? Que é Jesus.
Entrevistado: Sim, sim, sim.
Pará Rural: Então isso deu certo, né?
Entrevistado: Eu comecei a trabalhar, produzir chocolate para levar para Altamira. No início, eu ia participar só com chocolate branco com cumaru, no quesito inovação. Mas depois pensei: “Nossa, vou participar de todas as categorias.” Coloquei o chocolate ao leite também para concorrer e coloquei o chocolate intenso. O chocolate intenso, inclusive, não estava como eu ia pedir. Eu ia inscrever apenas ele, 80% de cacau. Quase para ir para Altamira, pensei: “Nossa, não. Vou colocar mais um.” Coloquei o 73%, sem a intenção de ganhar prêmio nenhum, mas apenas de participar. Conversei com o professor Jesus lá em Altamira. Falei: “Olha, professor, só de participar já é uma honra, né? Estar competindo com grandes nomes, grandes marcas de chocolate que são muito bem reconhecidas.” Fui lá, me inscrevi. Para minha surpresa, no terceiro lugar fui anunciado pela inovação do chocolate branco com cumaru. Fiquei muito feliz. Foi uma explosão imensa naquele festival.
Pará Rural: A sua família foi? Foi uma torcida?
Entrevistado: Não, não.
Pará Rural: Ou foi assim na emoção? Sei que tem gente que ficou até rouca de tanto torcer.
Entrevistado: Sim, sim.
Pará Rural: Tinha as torcidas lá, né?
Entrevistado: Com certeza, sim. Nós somos um grupo. Aqui do Baixo Tocantins a gente tem um grupo, estamos unidos. Daí o Lahire sempre incentivando, “Antônio, pode ir que tu vais ganhar o prêmio.” Eu estava sentado com ele. Começaram as premiações e, de repente, anunciaram o chocolate intenso, 73%, com segundo lugar. Fiquei muito feliz também. E para minha surpresa, em primeiríssimo lugar, o chocolate ao leite, 52%. Então, foram prêmios incríveis. Graças ao incentivo dos amigos, família, e foi um festival que marcou minha vida para sempre. Na volta para casa, recebemos mais incentivos ainda. Até estamos recebendo incentivos de pessoas que têm interesse em investir no nosso cacau, nosso chocolate. Com certeza é só o começo de muitos prêmios. Isso é só o começo.
Pará Rural: Com certeza. Parabéns, Antônio. Eu agradeço pela tua participação aqui no Pará Rural, agradeço ao Senar por sempre estar incentivando nossos produtores. Antônio está aí com essa história incrível que você acompanhou aqui no Pará Rural. Muito obrigada.